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jueves, 9 de agosto de 2012

um olhar psicanalítico para os contos de fadas

FRANZ, Marie-Louise Von (2005) A Interpretação dos Contos de Fadas, Paulus Editora, São Paulo, 240 pp.
Afirmar que os contos de fadas não são apenas textos divertidos para o passatempo e a educação de crianças não é novidade nenhuma desde que os psicanalistas da vertente junguiana lhes deram uma interpretação nova e diferente.
Marie-Louise von Franz, psicanalista suíça, discípula de Jung e sua colaboradora durante mais de trinta anos, tornou-se numa autoridade reconhecida na área de investigação dos mitos e contos de fadas. Este livro, desde o seu prefácio, feito por Léon Bonaventure, oferece-nos afirmações interessantes como nomeadamente que (p.5) "somente o amor é capaz de gerar a alma, mas também o amor precisa da alma". Nesta citação vê-se não apenas o reflexo do mito sobre Cupido e Psique, como também se confirma que em vez de se interrogar e buscar explicações dos nossos traumas e feridas, devemos aceitar e amar a nossa alma assim como ela é, e os contos de fada têm como uma das funções primordiais oferecer um reconforto ao ser humano e ajudá-lo a integrar-se no mundo e na comunidade em que vive, circunscrevendo o desconhecido e intentando revelar o que é o SELF de cada indivíduo ou de cada nação.
a autora deste estudo chama os mitos e contos de fada de "experiências arquetípicas" que surgem mediante a irrupção das imagens do inconsciente colectivo na experiência de um indivíduo e eis uma das possíveis razões de haver variações do mesmo tema nos contos de fadas de diferentes culturas.
Através da análise de um conto tradicional concreto As Três Penas encontrado pelos irmãos Grimm, pretende-se descodificar a múltipla simbologia da linguegem das personagens da narrativa, dos objectos que elas usam, as reacções dos participantes na intriga e toda uma série de acontecimentos que dão a esta história uma perspectiva mais profunda do ponto de vista da psicanálise. desta forma, as quatro personagens principais do conto (o velho rei pai e os seus três filhos) simbolizam as quatro funções psíquicas das quais falava jung nas suas teorias, mas na fase inicial nota-se a presença do princípio masculino, sem qulquer menção do feminino, uma vez que a rainha não faz parte do quadro dos protagonistas. Poder-se-ia pensar que nas antigas sociedades patriarcais o papel da mulher (ainda que fosse a própria rainha) não era muito considerado nos assuntos tão importantes como quem é que vai ser o herdeiro do trono. Marie-Louise von Franz, porém não oferece aos leitores uma visão tão simplista deste problema, uma vez que o terceiro filho, chamado por todos de "Tolo", o que sempre está mais próximo da terra, é quem entra em contacto com o feminino, através da Senhora Rã e das suas filhas rãzinhas, que simbolizam o feminino e completam o que falta na história. Há-que mencionar que as prendas que o rei pai pede (o tapete, o anel e a esposa) não foram escolhidas por acaso. Nas culturas orientais, o tapete é uma espécie de "continuação da terra", um objecto que oferece conforto, calor, abrigo, mas que não deixa de ser o mais próximo do chão, isto é do princípio telúrico e feminino. O anél, objecto redondo, que ao mesmo tempo vincula e isola, simboliza a união eterna e o desejo de pertença, no que também se reflecte o princípio feminino. A esposa mais bela que deveria corresponder ao herdeiro do trono e de ser digna dele é uma rã transformada em princesa. Este motivo é muito comum nos contos tradicionais indo-europeus, quer que se trate de rã que se transforma em princesa, quer que seja um sapo que se torna no príncipe mais belo mo mundo. Várias são as possíveis explicaç\oes para esta metamorfose, mas a autora deste livro é da opinião que a rã obtém a sua plena realização feminina na forma de princesa, mostrando que o princípio feminino é indispensável para completar o masculino. A quarta prova que pedem os irmãos do Tolo, na perspectiva desta investigadora, é apenas a afirmação da ideia que o número quatro é de facto aquele que ajuda a plena activação do SELF. Curiosamente, a última tarefa que deve ser cumprida, não é exigida dos filhos do rei, mas, sim das suas noras: a de saltar por uma argola, e ela é bem-sucedida apenas pela princesa, a esposa do filho mais novo. Por causa da sua vida anterior na pele de rã, ela é habilitada de fazer bem o salto. Há-que notar também que a argola tem a mesma forma que o anel e a mesma função, de vincular e isolar, de unir e separar. Como a argola pode representar o órgão sexual feminino, a que consegue fazer a prova sem se partir, consegue ser sexualmente iniciada com sucesso e desta forma garantir o herdeiro do trono, embora isso não seja explicitamente dito no conetúdo da história.
Na segunda parte do seu estudo Marie-Louise von Franz debruça-se sobre algumas das questões importantes para a psicanálise, tais como a existência e a manifestação do animus, da anima e da sombra nos contos de fadas e ilustra as suas afirmações com diversos exemplos de contos tradicionais, desde a tradição russa até à judáica.
A terceira parte, talvez a mais interessante do ponto de vista teórico e prático é a das perguntas feitas à autora e as suas respostas, em que com palavras simples explica a importância dos sonhos, contos de fada, arquétipos e outros termos da psicanálise junguiana. Uma das hipóteses desta investigadora é que Andersen aa través dos seus contos manifesta um tipo de neurose, condicionada pela rigorosa relação da igreja luterana em relação às questões da sexualidade e individualidade.
mesmo que esta possa ser uma interpretação um pouco radical da criação de Andersen, este livro representa um conjunto de estudos valiosos relacionados com o domínio do mito e dos contos de fadas, matéria que parece inesgotável e sempre actual, sempre nova e interessante, tanto para as crianças e adolescentes como para os adultos.

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