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jueves, 22 de mayo de 2014

Livro das Pedras, Paulo Pego, resenha

Bem-vindos ao meu mundo de imaginação. literatura, cinema, fotografia, tradução de poesia e conheçam contos da minha autoria
PEGO, Paulo, (2014) Livro das Pedras, Orfeu, Bruxelas, 79 pp.
Quer em termos linguísticos, quer na escolha de temas, imagens e ideias, O Livro das Pedras de Paulo Pego parece ainda mais complexo e, à primeira vista impenetrável que o livro anterior, embora haja algumas constantes temáticas, nomeadamente a denúncia da burocracia, a solidão e o absurdo da vida do homem moderno e a procura do amor e seu sentido. Água, ar e pedras (nas suas mais diversas modalidades) impregnam as páginas desta colectânea de poesia, contrapondo duas tendências: a da “liquidez” e instabilidade da realidade e das relações humanas e a procura da firmeza e estabilidade. Desta forma, o poema que abre a colectânea intitula-se “Humidade”, e transmite todas as imagens “molhadas” desde o sufocante calor das pessoas que saem do avião  e que certamente transpiram até à “chuva fina que dissolve o magma”,  a espuma a “água que mata sede”, “humedecer””, rio”, “gotas”, “fluxus”,” aluvião”, “arroios”, “líquido”, “húmida” (aqui o adjectivo parece ser usado de propósito no feminino, indicando todas as conotações possíveis com a reprodução, o princípio feminino, o sexo), “salivas”, “mar”. À abundância das referências à água, opõem se as planícies secas, o calor da Andaluzia, a cor ocre das pedras (relembrando o universo poético do espanhol Antonio Machado), o magma, a ignescência, a queimada beirã. Para além da água, um dos elementos mais presentes nos versos do Livro das Pedras é o ar, quer na sua vertente física, quer como símbolo da volatilidade da palavra. Palavra essa, que em momentos pode ser até de vidro, simultaneamente procurando e negando as pontes, podendo ser incapturável como o pássaro ou rasante.
Dialogando com poemas, pinturas, tendências literárias (dadaísmo, futurismo), artes gráficas, disposição das palavras, a sua semântica interior e os seus sentidos escondidos, partes de expressões populares (nada nem coisa nenhuma) e eruditas (em francês, latim, inglês), fábulas, História (sobretudo da Argentina), geografia (Portugal, Argentina, Espanha, espaços imaginários) o autor não revela apenas a cultura e os mais diversificados conhecimentos do autor, como também apela à curiosidade do leitor, convida-o a revisitar todo este imaginário cultural, a acrescentar e inscrever as suas próprias referências na leitura dos poemas e sobretudo a pensar.
Entre os problemas do homem moderno, que trabalha demasiado e por vezes deixa de pensar, as banalidades do quotidiano tais como os amaciadores de roupa e nódoas, na poesia de Paulo Pego há lugar também para a condenação dos rótulos dirigidos ao Outro, para as reflexões sobre o sentido da vida e para o amor, que aparenta ser a pedra mais firme de todo o livro, oferecendo uma determinada segurança ao homem perdido à procura da felicidade e afirmação, enquanto ser e enquanto poeta.
Tal como a colectânea anterior, o Livro das pedras não é de uma leitura fácil e superficial, procurando demonstrar ao mesmo tempo a impenetrabilidade do mundo e do universo interior do homem, a firmeza que procura na sua vida e a vulnerabilidade que não permite ostentar.


sábado, 17 de mayo de 2014

A LÓGICA DOS CORAIS de Paulo Pego, resenha

Bem-vindos ao meu mundo de imaginação. literatura, cinema, fotografia, tradução de poesia e conheçam contos da minha autoria
PEGO, Paulo (2013), A Lógica dos Corais, Orfeu, Bruxelas, 79.pp
Experimentar com palavras, viajar por espaços e tempos, reflectir a posição do indivíduo no mundo (a preocupação do homem contemporâneo, sufocado na rotina e na banalidade do quotidiano à procura de um sentido da vida: Deus? Amor? Relações Interpessoais?), (re)pensar o processo da criação literária, e sobretudo poética, combinar as cores das imagens que impregnam os seus versos com a interessante parte gráfica (posição, tamanho e forma das letras) caracterizam a poesia de Paulo Pego, que de forma alguma pode ser de uma leitura fácil ou unívoca. Estes poemas, verso após verso e página após página convidam o leitor a reflectir, a conquistar as ideias e expressões, à primeira vista talvez herméticas ou inacessíveis, para, após um olhar mais profundo, se tornarem mais próximos e familiares, mais legíveis e mais interiorizáveis, mais fáceis e compreensíveis, mais em conformidade com a sensibilidade e personalidade do autor.
Começando pela análise da imagem da capa, um desenho bastante original a carvão e lápis de cor, realizado por Maria Leal da Costa, nota-se a luta da vida, representada numa folha que se movimenta, saindo de um vazo cinzento e neutro, observado por uma lâmpada (evocando elementos do escritório em que o homem moderno passa a maior parte do dia-a-dia) contra a  monotonia do absurdo quotidiano.
Uma colectânea em que pairam as aparições, as recordações, os pequenos relâmpagos e cortes de um livro de viagens, alternando-se com as imagens do homem perdido, os seus temores do envelhecimento, da incomunicação, do isolamento. A Poesia de Paulo Pego dialoga com autores (Pessoa, Carlos Drumond de Andrade Dulce Maria Cardoso,  talvez até certo ponto com Gonçalo M. Tavares e Jorge Luis Borges), inspirando se em textos conhecidos, recriando-os e relembrando constantemente a inquietação do poeta por encontrar e afirmar a sua própria voz e expressão lírica, sem cair, porém, em estereótipos e lugares comuns…
Lugares… reais e ficcionais, sonhados e imaginados, visitados e revisitados: Sicília, Siracusa, Lisboa, os seus miradouros, cafés, restaurantes, carros de gelados, balcões, Sintra, São Petersburgo, Bruxelas, Viena, Dubrovnik, Turquia, Índia, cidades sem nome (apenas numeradas), Barcelos (referência às raízes e à identidade, “Eu Árvore”, sendo porém essa árvore “sempre inclinada para Esteiro)… Lugares utópicos, heterotópicos e distópicos simbolizam a procura, o desejo simultâneo de continuar a fluir como o rio, a tremer como os nervos, a ser um eterno peregrino, e de  uma necessidade de encontrar um ponto, uma pedra, um sítio estável e seguro.
Desde o próprio título, a cor vermelha domina através dos corais, vinho, paixão, explosão de napalm,  prazer,  sangue,   as feridas operadas sem anestesia, granadas, paletas,  fósforos, queimar, rubor, amor, calor, carne, romã, paisagens indianas, boca, sexo, cerejas. Entre outras cores mencionam-se apenas esporadicamente o verde, o branco, o azul, o negro e o cinza, mostrando, desta forma a vitalidade dos poemas e a força irresistível com que o poeta se opõe à monotonia da burocracia, ao sufoco das regras absurdas, isolamento, cânones incompreensíveis.
Questionando as regras, o poeta parece revoltar-se contra a ortografia em vigor, colocando partes de palavras entre parêntesis, pondo um ponto no meio da palavra (semi.tudo) ou no início da frase (.namorados), desrespeitando as maiúsculas e minúsculas, os signos de pontuação e por vezes a ordem das palavras, o poeta parece advogar a liberdade de expressão e a independência da palavra poética em relação às outras criações literárias. Com um vocabulário elaborado, um trabalho linguístico precioso, um estilo peculiar, o poeta provavelmente pretende não apenas pôr de manifesto a riqueza e variedade da língua portuguesa, como também deseja apurar e refinar o gosto do leitor pelo sofisticado e pelo sublime. Mesmo falando em sucatas, em assuntos banais como as bolachas que de devem vender em determinado tipo de lojas, em caixas de correio, carros de gelado, sente-se neste livro uma aspiração ao superior, ao absoluto, ao celestial. Mesmo num mundo cada vez mais globalizado, isolado, em que as pessoas se cruzam, ninguém se cumprimenta, as relações interpessoais são frouxas e superficiais, existe sempre uma esperança no Natal, nas águas baptismais, no crisma e num deus (curiosamente escrito com minúscula), que dá um sentido mais alto à vida humana.
Entre a arte comprometida e a poesia pela poesia, A Lógica dos Corais parece reivindicar a urgência da beleza da vida, expressa nas viagens e na criação e a necessidade do amor como sentido do percurso humano.


sábado, 10 de mayo de 2014

AVE SERBIA POEMA DE JOVAN DUCIC TRADUZIDO PARA PORTUGUÊS POR ANAMARIJA MARINOVIC

Bem-vindos ao meu mundo de imaginação. literatura, cinema, fotografia, tradução de poesia e conheçam contos da minha autoria
AVE SERBIA                               Jovan Dučić

O teu sol agora nas bandeiras é levado
Tu vives no orgulho furioso dos filhos
O teu céu luminoso connosco o levámos
E  as auroras para luzirem nos sonhados caminhos.

Ainda estás connosco, santa mãe torturada.
Todos os teus relâmpagos no brilhar das espadas
Todos os teus rios rugem no nosso sangue
E todos os ventos na nossa vingadora raiva.

Nós somos  o teu ser e o teu destino
O latir do teu coração no cosmos, Eterna,
O teu fado está escrito na testa do teu filho
À sua espada  vai  tua indizível palavra tremenda.

Com o leite do teu seio a nós envenenaste
Na dor e na glória para sermos os primeiros,
 Deste à luz a dois irmãos gémeos
O Mártir e o Herói, gota de lágrima e sangue

Tu és o signo no céu e luz na noite
 Ó, berço e túmulo na vestimenta de sol feita
És o legado amargo do sofrimento e do poder
E o único caminho que ao apogeu leva.

Somos tuas trompetes, vitórias e ondas
Do teu mar de fogo e dos teus rios do sol feitos
Nós, boa mãe, somos aqueles que demos
Cada gota de sangue por uma gota do teu leite.

Tradução: Anamarija Marinović


Tradução do poema "Nau francesa navega" (versão original) da autoria do Coronel Branislav Milosavljevic, A tradução é de Anamarija Marinoviº

Bem-vindos ao meu mundo de imaginação. literatura, cinema, fotografia, tradução de poesia e conheçam contos da minha autoria
Креће се лађа француска (оригинална верзија)
Сиње је море широко,
Широко, хладно, дубоко.
Креће се лађа француска
Са пристаништа солунска.
Одлазе моји другови,
Другови српски витези,
У земљу даљну Африку;
Сви носе тугу велику.
Из своје земље прогнани,
По свету блуде млађани;
Туђино мајко – маћијо,
Збогом занавек Србијо!
Па кад се море заљуља,
Махнито силно удара,
Сви моле Светог Николу,
Његову силу на мору!
Многи ће од њих бити плен,
Кад дође швапски сумарен,
Много је Срба пропало
У мору хладном остало.
Шта ли је Србин згрешио?
Богу се увек молио;
Седам се лета борио;
У рову славу славио.
Узалуд чекаш мајко ти,
Да ти се војно жив врати,
Море је ситомирује;
Јединца твогамилује!
Nau francesa navega (versão original)
O mar azul é largo
Largo, frio, profundo,
Nau francesa navega
Do porto de Tessalónica.

Partem os meus amigos
Amigos cavaleiros sérvios
Para África, terra afastada
Todos com tristeza tamanha.

Da sua terra desterrados
Pelo mundo, jovens vão errando
Madrasta - ó, mãe terra alheia!
Para sempre adeus, Sérvia!

E quando o mar se agita,
Desenfreados, intensos golpes dá
Todos oram a São Nicolau
 Pela sua força no mar.

Muitos presos serão
Quando chegar o submarino alemão.
Muitos sérvios pereceram
No mar frio permaneceram.

O que o sérvio terá pecado?
A Deus sempre tem rezado,
Durante sete anos lutou
Na trincheira o santo familiar festejou.

Em vão, mãe, tu estás a esperar
Para o teu soldado vivo voltar
O mar saciado – a sossegar

O teu unigénito - a acariciar.

Tradução do poema "Nau francesa navega" (versão cantada) do sérvio para português por Anamarija Marinovic

Bem-vindos ao meu mundo de imaginação. literatura, cinema, fotografia, tradução de poesia e conheçam contos da minha autoria
Креће се лађа француска
(најпопуларнија певана верзија)
Силно је море дубоко
Дубоко плаво, широко
Нигде му краја видети,
Не могу мисли поднети.

Креће се лађа француска
Са пристаништа солунска,
T
ранспорт се креће Србади,
Ратници браћа рањени.

Полазим тужан, болестан,
Помислих: „Боже, нисам сам.“
И моја браћа путују
И са мном заједно тугују.

Сваки се Србин борио,
 У рову славу славио,
Срећан се Богу молио,
Да би се кући вратио.

Радости нема ни за трен
Наиђе швапски сумарен,
Сви моле Светог Николу,
Његову силу на мору
!

Nau francesa navega (versão cantada mais popular)

Poderoso é o mar profundo
Profundo, azul, largo
O seu fim não se consegue observar
Pensamentos não os posso suportar.

Nau francesa navega
Do porto de Tessalónica
Navega o transporte dos sérvios
Guerreiros, irmãos feridos.

Parto triste, doente,
“Deus, não estou só”, pensei,
Os meus irmãos também viajam
E comigo juntos lamentam.

Cada sérvio esteve a lutar
Na trincheira festejou o santo familiar
Feliz a Deus esteve a rezar
Para ao seu lar regressar.

Não há um instante de alegria
Eis o submarino alemão que se aproxima
Todos oram a São Nicolau
Pela sua força no mar!                   Tradução; Anamarija Marinović