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jueves, 16 de agosto de 2012

mulheres não iluminadas


GODINEAU,  Dominique “A mulher” Michel VOVELLE (org.) O Homem do Iluminismo, Renascença, Lisboa, 1997, pp 311-334 recensão crítica por Anamarija Marinović

O capítulo dedicado à mulher na obra o Homem no Iluminismo, coordenada por Michel Vovelle, parte de uma ideia estereotipada que o Iluminismo trouxe mais direitos e uma posição melhor na sociedade para  a parte femiina da população e cita exemplos de numerosas damas nobres que reuníam intelectuais nas tertúlias nos seus salões. Porém, esta imagem é desmontada parcialmente: por um lado é certo que a mulher ocupa a atenção de muitos estudiosos, tornando-se objecto de interesse, por outro o seu estatuto e direitos profissionais e civis ainda em grande medida são determinados pelo homem.
            Os temas e problemas que preocupam os ilustrados na França são a existência de uma natureza especificamente feminina, que depende das suas funções do seu corpo. Desta forma Diderot denomina a mulher como “fêmea do homem”. Esta ideia da inferioridade do sexo feminino é uma continuação do pensamento fundamentado nos séculois anteriores e usa-se a palavra “sexo”, porque na altura não se empregava o termo “género” é inigualável à uma ética do universal. Se, segundo Poullain, “a mente não tem sexo” pregoa-se a ideia de que as mulheres precisam de educação, uma vez que por falta da sua instrução, surgem todas as dificuldades com as que ela tem que lidar.
Outro tópico dominante no estudo das mulheres é a existência da razão feminina, que, na opinião dos enciclopedistas, está subordinada ao seu útero, o que lhe atribui as seguintes características: uma estrema sensibilidade, uma grande capacidade de imaginação, capacidade de observar, enquanto o homem tem a faculdade de raciocinar. O papel que os cientistas desta época lhe destinam é o da mãe e boa esposa, que deve fazer todo o esforço possível para tornar a sua casa um lugar agradável, para dar uma educação correcta aos filhos, deve saber conversar, para ser digna companheira  de um homem iluminado. Por estes motivos é-lhe permitido saber ler, escrever, fazer contas e ter conhecimentos mínimos de história e geografia.  No Iluminismo português parece-nos interessante o caso de Luís António Verney que fala na necessidade da educação feminina, embora aenas no que se refere à esfera doméstica.
Um dos momentos importantes na vida de toda mulher, sem dúvida continua a ser o casamento, que é questionado pelos iluministas de várias formas. Ainda que alguns filósofos o reduzam apenas ao aspecto sexual durante toda a vida,  os iluministas franceses fazem diferença entre as classes mais altas, em que os casamentos são por regra combinados pelos pais de forma a possibilitar a prosperidade económica do casal enquanto os casamentos nas classes populares são vistos como uniões regidas pelos sentimentos mútuos. É polemizada a indissolubilidade do casaemnto, e a escolha pessoal do parceiro, em vez da imposição do par ideal feita pelos pais. Desta forma, na literatura espanhola do século XVIII salientamos a obra  El Sí de las Niñas, em que o autor Leandro Fernández de Moratín permite à jovem protagonita recusar o su pretendente muito mais velho do que ela, escolhido pela sua mãe apenas pela sua riqueza mterial.  A menina na obra não apenas tem o direito de expressar a sua opinião, como também tem e mostra o afecto pessoal por um jovem da sua idade, com o qual acaba por se casar no fim. Claro está que na realidade objectiva nem sempre era fácil conseguir-se uma união duradoura baseada no amor.
O trabalho feminino é uma das questões que o Iluminismo salienta; sendo ele necessário e obrigatório nos estratos sociais mais baixos, para a família numerosa poder sobreviver. Como profissões aceites destacavam-se a lavandeira, a vendedora, a criada, a costureira etc. Numa sociedade que põe a tónica na educação e escolarização, não é estranho que apareçam revistas destinadas ao público feminino propondo-lhe os saberes que se consideram necessários para a sua vida. Mesmo que nas épocas anteriores ao Iluminismo o convento seja um grande centro da educação feminina, os ilustrados dirigem-lhe críticas ásperas, acusando as ordens religiosas de deixar as jovens ignorantes e não preparadas para a vida. Insiste-se em que a mulher além da leitura, escrita, contas básicas e um pouco de cultura geral ee saber danar, tocar alguns instrumenos, e na cultura portuguesa, resonder a motes e improvisar poemas.Como um no caso extraordinário cita se o de Vitorine de Chastenay, que desde menina sabia latim, que tinha aprendido juntamente com o irmão, e que tinha conhecimentos de história, geografia, aritmética, inglês, religião, música e desenho. Ela representa o modelo da mulher livre pensadora que não se dedica a conversas superficiais.
As leituras recomendadas à mulher iluminista são as de “exemplo e proveito”, autores clássicos, romances, livros de história e o que se considera perjudicial são livros de temática amatória ou aqueles que podem estimular demasiado a sua imaginação. Quanto à escrita, a forma epistolar foi muito rapidamente apropriada pelas mulheres, porque através de um género privado, ela consegue expressar as suas ideias sobre vários assuntos importantes do domínio público.
Voltando à ideia inicial da mulher iluminista no salão, o autor salienta a capacidade da mulher de se adaptar a novas circunstâncias culturais e de ir conquistando o seu espaço não apenas na esfera privada, como cada vez mais no público, uma vez que a sua casa abre as portas a intelectuais, permite-lhe trocar opiniões, encontrar pessoas, criaar  e tomar posições.
Tendo alargado o espaço em que actuavam, as mulheres aparecem cada vez mais na vida política. Como exemplos disso o autor cita os casos da Maria Teresa de Áustria e Catarina a Grande na Rússia (que se escrevia com Voltaire) e de algumas revolucionárias francesas, que abriram novos caminhos para a mulher na sociedade e que influenciaram o desenvolvimento do feminismo.
Este capítulo, de forma clara, simples e sintética dá a conhecer a situação da mulher no Século das Luzes, apontando para algumas dificuldades reais com as quais ela teve de lidar, e que hoje em dia podem considerar-se questões resolvidas (o direito da mulher à educação, ao trabalho, à escolha do parceiro para o casamento). Há, porém problemas que nem sequer hoje em dia estão completamente acabados de resolver ( como por exemplo a igualdade absoluta entre o homem e a mulher).
Este capítulo é uma excelente síntese da posição da mulher na sociedade do século XVIII, a nível pessoal e profissional. Mesmo depois desta pequena amostra do livro podemos chegar à conclusão de que a obra toda salienta os aspectos mais importantes da posição do homem na cultura, sociedade e vida privada no Século das Luzes, sobre tudo na França.

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