Entradas populares

jueves, 25 de abril de 2013

ferrugem e osso

BEM-VINDOS AO APAIXONANTE MUNDO DE LETRAS PRECIOSAS E IMAGENS ENCANTADORAS, SEJAM LEITORES, OBSERVADORES, CRÍTICOS E PALAVRÓFILOS, LEIAM, LEIAM, LEIAM. MESMO QUE UM PROVÉRBIO POPULAR SÉRVIO DIGA QUE "A CABEÇA É MAIS VELHA QUE O LIVRO", ISTO É QUE O PENSAMENTO É MAIS ANTIGO QUE A ESCRITA, LEIAM, ISSO AGUÇA O ESPÍRITO, ENRIQUECE O VOCABULÁRIO E A ALMA, DESPERTA A CURIOSIDADE E FAZ VOS PALAVRÓFILOS CURIOSOS TAMBÉM...
Filme: Ferrugem e Osso
Género: Drama Duração: 120 min
Com: Matthias Schoenaerts, Marrion Cottiliard
Realização: Jacques Audiard.
Desempregado, sem dinheiro, sem amigos nem planos para o futuro, Ali deve começar a tomar conta do seu filho Sam. Até chegar á casa da da sua irmã, Ali juntamente com o menino passa dificuldades, fome, dores, frio etc. decidindo encontrar um emprego e organizar a sua vida, Ali começa a trabalhar como segurança numa discoteca, até que uma noite conhece uma jovem atraente que gosta de se sentir desejada e de suscitar o interesse dos homens. Um dia, no seu trabalho de treinadora de orcas, esta rapariga sofre um grave acidente e perde ambas as pernas. Com a ajuda de Ali consegue ir recuperando a sua auto-estima, reintegra-se na sociedade, aceita a nova situação do seu corpo e sentir-se amada e desejada outra vez.
Embora a intenção inicial do filme tivesse sido a de dar valor à vida, as relações interpessoais e ao carinho e amizade, é uma obra que assenta em várias fragilidades: em primeiro lugar não se refere o que é que tinha acontecido à mãe do menino (menciona-se apenas uma vez na pergunta quando é que a mãe vem, e na resposta do pai que ela voltaria em breve), e não se sabe se os pais se divorciaram, se a mãe morreu ou se os abandonou. As personagens centrais não são muito aprofundadas, sobre tudo no caso de Ali, que antes de correr o risco de perder o filho debaixo do gelo, é um pai violento, superficial, pouco sensível para as necessidades do filho, é desleixado, esquece-se de ir à escola e buscá-lo por causa das relações sexuais ocasionais num ginásio. É um pai que grita e não tem paciência com o filho, mostrando-se completamente diferente com a Stéphanie, rapariga que mal conhece, mas a quem se dedica inteiramente após o acidente que a deixou com grave deficiência. Com a sua irmã Ali também não tem uma relação muito próxima e nem sequer se esforça por estabelecê-la, sendo indirectamente culpado pela perda sua perda de emprego.
A única pessoa por quem mostra alguma compreensão é a treinadora de orcas. A relacionamento entre eles inicialmente baseia-se apenas numa sexualidade bastante bizarra (ela pretende descobrir se o seu corpo ainda é capaz de reagir a estímulos sexuais e ele quer mostrar que está "opé" (operacional) em qualquer momento. No filme há demasiadas cenas muito explícitas do corpo amachucado de Stéphanie, entregue ao prazer sexual, que por um lado afirmam que uma pessoa deficiente tem todo o direito de sentir, amar e ser desejada, e por outro parecem um tanto perversas, porque as cicatrizes, as tatuagens que dizem "esquerda" e "direita" e os restos das pernas que não foram atingidos pelo acidente provocam muita repulsa em quem vê, se não tiver em conta a pessoa concreta em questão. A relação entre os protagonistas aprofunda-se tornando-se cada vez mais um verdadeiro namoro cheio de apoio, confiança. O que une ainda mais os protagonistas no fim do filme são os seus defeitos físicos, uma vez que Ali partiu ambas as mãos tentando salvar o filho da morte.
Não podendo exercer nunca mais os seus trabalhos perigosos (o treino de orcas e as lutas na rua por dinheiro), Ali e Stéphanie compreendem que na vida há outros caminhos e outros valores: a amizade, a tolerância, a auto-aceitação e a plena aceitação do Outro.
Apesar de uma história muito emocionante, a excessiva violência e inúmeras e demasiado longas cenas das relações sexuais um tanto estranhas entre os protagonistas poderiam ser destacados como os seus pontos fracos.
Embora sem dúvida a sexualidade seja uma parte importante na vida das pessoas com alguma deficiência, não é o único aspecto que vale salientar e em que se deve insistir para elas serem consideradas normais. Mais importante no caso deste filme, é o reencontro de Stéphanie com os seus amigos (uma cena sem palavras, mas muito intensa), o desejo de voltar a ver as orcas e ultrapassar o seu trauma, a sua vontade de voltar a dançar e ir à discoteca, compreendendo as suas limitações. O momento em que os protagonistas se beijam na boca pela primeira vez é muito emocionante, porque revela uma verdadeira intimidade e cumplicidade e proximidade entre eles.
Por vezes demasiado longo e disperso em pormenores desnecessários (cenas em que a protagonista vai á casa de banho e em que se ouve a sua urinação, os pequenos furtos no supermercado feitos pela irmã de Ali), o filme é bastante realista e ao mesmo tempo optimista, fazendo reflectir sobre a beleza da vida, a intensidade dos pequenos momentos fugazes de felicidade, o amor, os rituais e o sentido das tragédias que purificam as pessoas e cristalizam as coisas e as situações.



lunes, 22 de abril de 2013

pedagogia através de enfrentar a dor

BEM-VINDOS AO APAIXONANTE MUNDO DE LETRAS PRECIOSAS E IMAGENS ENCANTADORAS, SEJAM LEITORES, OBSERVADORES, CRÍTICOS E PALAVRÓFILOS, LEIAM, LEIAM, LEIAM. MESMO QUE UM PROVÉRBIO POPULAR SÉRVIO DIGA QUE "A CABEÇA É MAIS VELHA QUE O LIVRO", ISTO É QUE O PENSAMENTO É MAIS ANTIGO QUE A ESCRITA, LEIAM, ISSO AGUÇA O ESPÍRITO, ENRIQUECE O VOCABULÁRIO E A ALMA, DESPERTA A CURIOSIDADE E FAZ VOS PALAVRÓFILOS CURIOSOS TAMBÉM...

Professor Lazhar

Título original:
Monsieur Lazhar
De:
Philippe Falardeau
Com:
Mohamed Fellag, Sophie Nélisse, Émilien Néron
Género:
Drama
Cinema: El Corte Inglés
 Após o suicídio de uma Professora dentro da sala de aula,inesperadamente chega o substituto, o Professor Bachir Lazhar, imigrante argelino, que usando métodos antigos (corrigindo os trabalhos de casa a vermelho, dando ditados, obrigando os alunos de onze anos de idade a lerem Balzac e a escreverem composições sobre a violência escolar, não permitindo que os alunos o tratem por "tu", redistribuindo as mesas outra vez em filas direitas) consegue ganhar a cnfiança dos alunos, despertar o interesse pela aprendizagem, pelas outras culturas e ajuda-os a crescerem, amadurecerem e ultrapassarem o trauma que a morte da sua Professora lhes tinha causado. Tendo sofrido uma perda muito grande recentemente (a sua esposa foi vítima do terrorismo no seu país de origem),  o Professor Bachir Lazhar, cujo nome próprio é bastante simbólico (Bachir significa "portador de boas notícias" e "Lazhar" significa "afortunado"), tenta trazer para a sala de aula os temas da perda, da morte, da violência e encontra uma grande resistência por parte dos outros colegas e sobretudo da Directora da escola, que é da opinião que as crianças devem ser educadas evitando quaisquer perguntas ou noções sobre os temas "difíceis". Como resposta aos métodos do novo Professor, a Direcção da escola sempre lhe menciona a morte da Professora Martine e o respeito que se deve ter pela memória dela. Levantando a questão se o suicídio dentro da sala de aula também não seria uma falta de respoeito com os alunos, o Professor consegue lidar com este problema, fomentar discussão entre os alunos e esclarecer que a morte da sua colega anterior não foi culpa de nenhum deles, especialmente não de Simon, aluno que a repeliu violentamente e que lhe negou um abraço.
Pelo que os alunos contam sobre a Professora Martine e pelo que se vê na fotografia que um dos alunos lhe tinha tirado (a dar aulas com um par de asas nas costas), vê-se que os seus métodos eram bastante alternativos, que permitia aos alunos que a tratassem pelo nome e não pelo título, que fomentava trabalhos de grupo e espírito de equipa, mas que mesmo assim não conseguia lidar com a sua ansiedade, o que a levou a cometer o suicídio dentro da escola. Nada se sabe, porém sobre a razão da sua angústia, nem acerca da sua relação com o marido, a não ser que ele não apareceu na escola para buscar as coisas que lhe pertenciam), nada se sabe sobre as dificuldades reais que teria esta Professora no seu trabalho (uma vez que a sua turma não revelava comportamentos particularmente preocupantes), mas o que se sabe certamente é que não sabia lidar com a sua dor de forma mais apropriada.
Além da figura marcante do Professor Lazhar, as personagens de Simon, da menina Alice, a aluna mais madura da turma e de Victor, caracterizado como "atrasado mental" estão construídas de uma excelente forma, mostrando toda a profunidade dos seus temores, preocupações, pensamentos, reflexões e inquietações mais íntimas. A fotografia e uma excelente realização reforçam a beleza desta história emocionante sobre o papel da educação correcta e dos bons professores no percurso da vida de cada criança. Este é um filme sobre a tristeza, a dor, a perda, a culpa, mas também sobre a amizade, o apoio, o respeito, a integração na sociedade (no caso do aluno árabe que tem que falar francês no horário das aulas e dos intervalos, sendo essa a língua oficial do Quebec), do amor e da esperança, que triunfam e que ensinam valores para a vida. Por isso esta é uma grande obra de arte que vale a pena ver e que por causa da sua forte componente pedagógica é recomendável para ser vista nas escolas, tanto pelos alunos como pelos pais e Professores.

sábado, 13 de abril de 2013

poema á mulher, tradução

BEM-VINDOS AO APAIXONANTE MUNDO DE LETRAS PRECIOSAS E IMAGENS ENCANTADORAS, SEJAM LEITORES, OBSERVADORES, CRÍTICOS E PALAVRÓFILOS, LEIAM, LEIAM, LEIAM. MESMO QUE UM PROVÉRBIO POPULAR SÉRVIO DIGA QUE "A CABEÇA É MAIS VELHA QUE O LIVRO", ISTO É QUE O PENSAMENTO É MAIS ANTIGO QUE A ESCRITA, LEIAM, ISSO AGUÇA O ESPÍRITO, ENRIQUECE O VOCABULÁRIO E A ALMA, DESPERTA A CURIOSIDADE E FAZ VOS PALAVRÓFILOS CURIOSOS TAMBÉM...

Jован Дучић

 ПЕСМА ЖЕНИ

Ти си мој тренутак, и мој сен, и сјајна
Моја реч у шуму; мој корак, и блудња;
Само си лепота колико си тајна;
И само истина колико си жудња.
Остај недостижна, нема и далека —
Јер је сан о срећи виши него срећа.
Буди бесповратна, као младост; нека
Твоја сен и ехо буду све што сећа.
 
Срце има повест у сузи што лева;
У великом болу љубав своју мету;
Истина је само што душа проснева;
Пољубац је сусрет највећи на свету.
Од мог привиђења ти си цела ткана,
Твој је плашт сунчани од мог сна испреден;
Ти беше мисао моја очарана;
Символ свих таштина поразан и леден,
А ти не постојиш нит си постојала;
Рођена у мојој тишини и чами,
На сунцу мог срца ти си само сјала:
Јер све што љубимо створили смо сами. ´
 
Poema`a  mulher  Jovan Ducic
 
Tu és o meu instante, minha sombra e luminosa
palavra minha no ruido, meu passo e divagação minha
Apenas es beleza quanto és misteriosa
e apenas és verdade quanto és ânsia.
 
Fica inalcançável, muda e longíngua
 o sonho da felicidade que a felicidade é maior
Sê irreversível, como a juventude  e que
 a tua sombra e eco sejam toda a memória
 
O coração tem história na lágrima que derrama,
na grande dor o seu alvo tem o amor
A verdade é apenas o que sonha a alma
o beijo é o encontro no mundo maior.

Da minha quimera tu toda és trançada

o teu manto de sol do meu sonho é urdido
tu eras a minha ideia encantada
símbolo de todas as vaidades,esmagador e frio.

Mas tu não existes nem existias jamais
no meu silêncio e tédio nascida
no sol do meu coração tu apenas brilhavas
porque a tudo o que amamos, nós mesmos demos vida.
Tradução: Anamarija Marinovic
 

lunes, 1 de abril de 2013

dor e sofrimento na infância

BEM-VINDOS AO APAIXONANTE MUNDO DE LETRAS PRECIOSAS E IMAGENS ENCANTADORAS, SEJAM LEITORES, OBSERVADORES, CRÍTICOS E PALAVRÓFILOS, LEIAM, LEIAM, LEIAM. MESMO QUE UM PROVÉRBIO POPULAR SÉRVIO DIGA QUE "A CABEÇA É MAIS VELHA QUE O LIVRO", ISTO É QUE O PENSAMENTO É MAIS ANTIGO QUE A ESCRITA, LEIAM, ISSO AGUÇA O ESPÍRITO, ENRIQUECE O VOCABULÁRIO E A ALMA, DESPERTA A CURIOSIDADE E FAZ VOS PALAVRÓFILOS CURIOSOS TAMBÉM...
VASCONCELOS, José Mauro de (1968)  O Meu Pé de Laranja Lima, Melhoramentos, São Paulo, 192 pp.
"A história de um meninozinho que um dia descobriu a dor" poderia ser a ilustração perfeita do conteúdo deste peculiar romance infanto-juvenil, que por sua vez levanta muitas questões: se as histórias para crianças devem conter referências à dor, ao sofrimento, aos maus tratos e caso a resposta seja afirmativa, de que forma estas questões devem ser abordadas, sem que os seus leitores fiquem traumatizados ou emocionalmente inibidos na sua posterior vida adulta.
Narrando a infância de Zezé, um menino nascido no seio de uma família numerosa e pobre no Brasil,  José Mauro de Vasconcelos aborda o problema do crescimento e amadurecimento precoce das crianças carenciadas, a quem não se dedica a devida atenção na família, e que são educadas com métodos violentos (chineladas no rabo, bofetadas, puxões de orelhas) e que devido às difíceis condições socio-económicas em que vivem desde cedo são privadas até dos bens essenciais como o lanche, os sapatos, os medicamentos. Da mesma forma, uma infância cortada demasiado prematuramente pela falta de alegrias mais fundamentais como as prendas e a união da família no dia do Natal deixam na alma do protagonista marcas muito profundas, que o obrigam a revoltar-se contra muitas injustiças e a reagir de uma forma demasiado impulsiva ("como é ruim a gente ter pai pobre"), mas também ess mesma situação enche-o de remorsos e de culpas, trabalhando muito duro no dia do Natal e suportando humilhações e desprezo para poder comprar um cigarro ao pai desempregado.
O desejo do saber, a curiosidade que o leva aprender tudo, até os palavrões e "palavras difi´ceis" como " cadáver", "nádegas" ou "troglodita" transportam este menino para os mundos melhores e mais bonitos: o do cinema, em que imagina ser amigo próximo dos grandes heróis dos seus filmes preferidos, o da natureza, em que aprende a crescer e a desenvolver-se graças aos seus amigos o passarinho, sua voz interior que o ajuda a cantar sem palavras e a compreender o mundo, o pé de laranja lima, árvore a quem ele confia os seus medos, preocupações, sonhos, ideias sobre o futuro. Os familiares: o titio Edmundo, os irmãos Totoca e Luís, a irmã Glória, a mãe e até o "papai", essa figura ambivalente por quem o menino sente ao mesmo tempo rancor por causa da miséria em que vive, medo, respeito, compaixão e amor, ensinam-no, cada um à sua maneira as grandes verdades da vida: o que é a miséria, o que é a dignidade, a dor, o sofrimento, a esperança e a amizade. Carenciado de afectos e palavras carinhosas, vivendo em circunstÂncias demasiado duras para uma criança, consola-se e refugia-se nas aulas da sua professora, D. Cecília Paim, feia, mas generosa, que por vezes lhe dá dinheiro para comprar o bolo, sonho recheado, que não é por acaso que tem esse nome, uma vez que para um menino que passa fome, até esse gesto pequeno pode ser o alcance de um sonho, recheado do pensamento que ainda existem pessoas no mundo que não são malvadas. Outra figura interessante no romance é a personagem do "Portuga", Sr. Manuel Velardes, que gosta muito do menino, compra-lhe doces e refresos, passa tempo com ele, dá-lhe boleia no carro, leva-o a pescar e passear e tem uma coisa em comum com ele: é muito amigo da sua árvore Rainha Carlota. O portuga para Zezé é um reflexo no espelho de tudo aquilo que o pai não é: tem modales, é sofisticado, tem paciência, é educado e culto, é gordo e meigo como um rei dos jogos de cartas e entre eles cria-se uma amizade muito profunda, que não se baseia apenas nos bens materiais que o menino recebe, mas que vai até ao desejo de o menino ser adoptado.
porém, tudo o que mantém o protagonista no mundo da ilusão e imaginação, bruscamente é-lhe retirado das mãos, quando se apercebe que está a crescer, solta o seu passarinho interior, decide não ver mais filmes violentos e opta pelos filmes de amor em que "há muito abraço, muito beijo e toda a gente se gosta", o seu amigo Portuga é morto pelo comboio e o seu pé de laranja lima é cortado, até os lugares de que gosta vão-lhe ser retirados, porque se virá obrigado a viajar com a família para Santo Aleixo, onde o seu pai terá um emprego novo.
A constante privação e os esforços para sobreviver na miséria e na fome, a constante luta com a dor (física quando corta o pé com o caco de vidro ou quando é espancado pelo pai) emocional (a morte do amigo português, a tristeza pela falta de prendas de Natal, a resignação com o facto de a sua árvore preferida ser cortada) e psicológica quando é confrontado com o desamor e a negligência dos seus próximos obrigaram Zezé a crescer muito prematuramente e mesmo assim a não perder algo da sua ternura e inocência de criança. É justamente por isso que não quer dizer ao seu irmãozinho Luís que foi ele que comeu a galinha negra e prefere dizer-lhe que ela foi passar férias perto do Amazonas. mesmo que as suas ilusões tenham sido várias vezes negadas e desmanchadas de formas cruéis, ele prefere manter o Luís no estado de pureza, inventando para ele as mais belas histórias, imaginando que os animais do quintal são os habitantes do jardim zoológico, que o pátio da casa é a Europa pela qual eles costumam viajar etc.
Ainda que se fale na violência e na crueldade com palavras claras e muito abertamente, o final do livro é optimista: o pai vai ter um emprego melhor, nunca mais vai faltar prenda no seu sapatinho de Natal, ele consegue crescer e distribuir bolas de gude e outras coisas a crianças carenciadas, o que revela que existem a esperança e a ternura no mundo, que nem tudo é tão corrupto e tão desalmado e que o Menino Jesus não gosta apenas de meninos ricos, mas de todos aqueles que nele acreditam, recompensando justamente os que por ele suportaram o sofrimento com paciência e sem protestar.
Com muitos regionalismos e características da linguagem brasileira na escrita, esta obra torna-se próxima não apenas dos leitores do Brasil , da condição social e económica parecida  com a de Zezé, mas abre as portas para qualquer leitor europeu, que se queira identificar com o protagonista e o seu mundo. Embora marcadamente brasileira, esta criação literária toca nos temas universais e certamente sempre actuais como o crescimento, a infÂncia, o sofrimento e a dor, a importÂncia da família e a existência de carinho mesmo no meio familiar mais mal estruturado, que é o que dá a este romance um tom menos sombrio e mais humano, pelo qual este livro se deveria recomendar ao público mais novo.

em busca de Alfred Hitchcock

BEM-VINDOS AO APAIXONANTE MUNDO DE LETRAS PRECIOSAS E IMAGENS ENCANTADORAS, SEJAM LEITORES, OBSERVADORES, CRÍTICOS E PALAVRÓFILOS, LEIAM, LEIAM, LEIAM. MESMO QUE UM PROVÉRBIO POPULAR SÉRVIO DIGA QUE "A CABEÇA É MAIS VELHA QUE O LIVRO", ISTO É QUE O PENSAMENTO É MAIS ANTIGO QUE A ESCRITA, LEIAM, ISSO AGUÇA O ESPÍRITO, ENRIQUECE O VOCABULÁRIO E A ALMA, DESPERTA A CURIOSIDADE E FAZ VOS PALAVRÓFILOS CURIOSOS TAMBÉM...
Filme: Hitchcock
Género: Drama
Duração: 98 min.
Cinema: cinema city Classic Alvalade
Realização: Sacha Gervasi
Com: Anthony Hopkins, helen Mirren, Scarlet Johanson
Com a utilização de excelentes técnicas narrativas (do próprio Hitchcock como narrador da história e o seu protagonista), com um profundo conhecimento da obra e do carácter do realizador e a ideia de presentar o lado humano desta célebre figura da cinematografia mundial, o filme baseado no livro "Alfred Hitchcock and the Making of Psycho" apresenta também alguns dos problemas inerentes ao mundo dos famosos: a desconfiança das companhias de produção perante um projecto inovador, as rivalidades entre as grandes e prestigiadas empresas no mundo do cinema,  o rigor da censura e a complexa e ambivalente relação entre o realizador e a sua esposa Alma. Esta relação naturalmente tem os seus altos e baixos, mas torna-se particularmente difícil para ela, porque está sempre na sombra do nome do marido e parece não conseguir revelar a sua própria criatividade e amor pela escrita. Por outro lado, mesmo depois de discussões, confrontos e respostas demasiado frontais, ela é a única que acredita nele, no seu talento e no seu sucesso. Ainda que nunca tivessem assinado juntos a autoria de nenhuma obra, e especialmente não a de Psycho, "Hitch" e Alma mostram que os dois são personalidades fortes, inteligentes, criativos, cada um com a sua vaidade, sentido de humor, dores, medos e preocupações. Desta forma, quando Hitchcock reconhece que o seu pior medo é o encontro com o censor, que lhe custa mais do que a ida ao dentista, o espectador consegue vislumbrar o lado humano do grande realizador. Os seus ciúmes quando a esposa passa horas e horas numa casa na praia dedicando-se à escrita, e por outro lado a sua obsessão pelas actrizes louras revelam um profundo temor de se ser deixado e abandonado, o que torna a sua personagem ainda mais complexa. O ligeiro cinismo e sentido de humor bizarro nas respostas e nalguns comentários são apanas pequenos indicadores do porquê da preferência pelo tipo de filmes e pela forma de encarar a sua realização no caso de Hitchcock. Ultrapassando os limites do esperado, do comum e do "clássico" no cinema até ao aparecimento de "Psycho", Alfred hitchcock mostrou ao mundo que um filme de terror podia não ser banal e superficial e que joga com as esferas mais profundas do íntimo e do emocional nos homens.
A personagem da sua esposa é ao mesmo tempo contraposta e complementar ao realizador, uma verdadeira "alma" gémea, que o defende perante os seus colegas, jura e obriga os outros membros da equipa a jurarem que não iriam divulgar nem revelar os segredos do filme. Envolvendo-o de mistério, desta forma pretendia garantir um sucesso ainda maior da obra do seu marido, participando nele mais "dos bastidores" embora seja indicado que algumas das ideias e sugestões para o desenvolvimento do filme fossem dela.
A excelente escolha de actores, a brilhante realização e a alta qualidade das imagens são apenas algumas das numerosas mais-valias do filme que com certeza absoluta valerá a pena ver.