BEM-VINDOS AO APAIXONANTE MUNDO DE LETRAS PRECIOSAS E IMAGENS ENCANTADORAS, SEJAM LEITORES, OBSERVADORES, CRÍTICOS E PALAVRÓFILOS, LEIAM, LEIAM, LEIAM. MESMO QUE UM PROVÉRBIO POPULAR SÉRVIO DIGA QUE "A CABEÇA É MAIS VELHA QUE O LIVRO", ISTO É QUE O PENSAMENTO É MAIS ANTIGO QUE A ESCRITA, LEIAM, ISSO AGUÇA O ESPÍRITO, ENRIQUECE O VOCABULÁRIO E A ALMA, DESPERTA A CURIOSIDADE E FAZ VOS PALAVRÓFILOS CURIOSOS TAMBÉM...
STEINER,
George, SPIRE Antoine (2004) Barbárie da
Ignorância, Fim do Século, Lisboa, 106 pp.
Consagrado
como linguista, crítico literário, ficcionista, pensador e filósofo de ideias
fortemente cosmopolitas, Geoge Steiner é por ventura menos conhecido pela sua
esfera mais íntima e pessoal, é justamente este aspecto que é apresentado na
série de entrevistas feitas por Antoine Spire. Que todos os preconceitos,
estereótipos e “barbáries” provêem da ignorância, é mais do que um lugar comum,
e por isso não é de estranhar que o livro comece com o destaque da vasta
cultura e pluriculturalidade em que este pensador foi educado desde a infância.
Nascido em Paris, de pais judeus da origem checa e austríaca, trilingue, grande
leitor de obras dos célebres autore clássicos e defensor do ensino e
aprendizagem do latim e do grego, como dois grandes pilares da erudição
europeia, George Steiner teve o privilégio de criar a sua identidade por cima
dos nacionalismos, tendências políticas militantes ou qualquer totalitarismo
que impedisse que ele hoje seja considerado um dos espíritos mais liberais e tolerantes
da ciência europeia actual. Embora tenha feito o seu Bar Mitswa (confirmação ao
judaísmo), fê-lo mais para se inscrever no “clube do qual não nos demitimos” do
que para afirmar a genuína pertença afectiva e cultural à comunidade judaica.
Isto descobre-se quando o autor confessa ter abandonado o estudo do hebraico
por mera preguiça e também para dar preferência ao estudo do grego e do latim.
Steiner, poliglota desde a infância, é um fervoroso defensor da aprendizagem
das línguas estrangeiras, porque na sua opinião, elas são as vias pelas quais
se acede “à felicidade de uma outra civilização” (p.17), mecanismos que ajudam
a perceber as psicologias e mentalidades dos povos que as falam, um degrau para
o cosmopolitismo e a verdadeira “cidadania do mundo”.
É
interessante saber que este pensador dá um grande valor à persistência,
perseverância e luta, uma vez que nasceu com uma ligeira deficiência no braço
direito , mas mesmo assim aprendeu a escrever com a mão direita e a viver e
encarar seu defeito como um grande
privilégio e não como estigma e “uma escola de esperança em que cada progresso
é objecto de registo”, referindo o lema de Espinosa que “a coisa excelente deve
ser difícil”. Este exemplo é mais um convite para a reflexão, mais um
chamamento de atenção aos saudáveis não apenas para não desvalorizarem e
discriminarem as pessoas diferentes, mas também para examinarem as suas
próprias capacidades e limitações.
Além
de aspectos pessoais do célebre autor, esta obra apresenta as suas reflexões
sobre a linguagem, a literatura, a posição do poeta e da poesia face à
barbárie, a filosofia de Heideger, os limites da fé, a cultura, as diferenças
entre a crítica literária e a literatura. Com uma ligeira ironia sobre este
assunto e sobre si próprio, Steiner refere que se cada um dos críticos fosse
capaz de escrever uma obra de Joyce ou um poema de Puchkine, não seria um “prof” comodamente sentado no seu
departamento ou dando aulas a quem o quer ouvir. Na sua opinião, o ser
professor é mais d que uma profissão, é vocação, missão e “doença” no sentido
mais positivo e apaixonado da palavra, uma vez que “quem não estiver doente de
esperança, não tem a mais pequena hipótese de ser professor” (p.98). É nesta
frase um tanto missionária que se vê toda a entrega que Steiner revela em
relação à sua própria profissão, e também um convite para o exame de
consciência e de vontade para quem quer seguir o difícil e atraente caminho de
transmissor de conhecimentos saberes a
gerações posteriores
É
interessante também a singular visão que este pensador tem sobre Hitler e a sua
capacidade de falar em público e seduzir as massas, sendo que “o génio da
retórica de Hitler é a morte da nossa linguagem” (p.37). Reconhecendo este
talento a uma das figuras mais negativas e sombrias da História da humanidade,
Steiner interroga-se sobre os limites do conhecimento, sobre as falhas humanas
e sublinha o perigo das más interpretações da língua e da palavra, entidades
inseparáveis do pensamento e da lógica.
Esta
série de entrevistas está dividia segundo o critério temático em “capítulos”
com títulos atraentes e bastante originais (Quatro
contentores do lixo na Lua, Um planeta vazio no sal grego da manhã, Um clube
limpo de judeus, O nome do Deus desconhecido) que tratam dos temas que
preocupam o autor, desde a criação da identidade até à ficção científica e o
valor da erudição. Mais uma vez com linguagem clara ideias penetrantes, esta
obra chega ao leitor com uma incrível capacidade de sedução, mostrando vezes
sem conta que “o espírito humano é indestrutível, totalmente” (p.80) convidando
o público a viver, sentir, pensar e expressar-se de uma forma única e original.
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