Título
do filme: Florbela
Género:
drama
Elenco:
Dalila Carmo (Florbela Espanca), Albano Jerónimo (Mário Lage), Ivo Canelas
(Apeles), António Fonseca (João Espanca), Carmen Santos (Henriqueta)
Realização
e argumento: Vicente Alves do Ó
Produção
Ukbar Filmes
Nos
cinemas a partir de 8 de Março
Ante-estreia:
28 de Fevereiro de 2012 cinema São Jorge
Recensão
por: Anamarija Marinović
O ser artista, é ser mais alto, é
ser maior do que os homens (…) e é amar-te assim tão perdidamente
Adaptado
e modificado para as necessidades da arte no geral e não apenas para a poesia,
o verso de Florbela Espanca parece ser o ideal para caraterizar o novo filme de
Vicente Alves do Ó, a sua segunda longa-metragem, que depois dos Quinze Pontos na Alma, continua a
preocupar-se com a condição feminina, elogiando as personalidades fortes e
complexas de mulheres.
Este
filme é mais do que uma biografia da famosa poeta portuguesa, é uma homenagem a
ela e a todas as mulheres não conformistas, que procuram o amor, a felicidade e
a sua afirmação num mundo abundante em preconceitos e estereótipos. Num
Portugal conservador, da época do fim da Primeira República, resistente a todo
tipo de novidades, destaca-se uma mulher de calças, com um cigarro numa mão e um copo de vinho
noutra, com três casamentos e duas separações assumidas, que ainda por cima
escreve versos numa localidade provinciana em que para a mulher é aceitável
apenas ser uma esposa obediente e uma mãe devota, sem quaisquer perseptivas no
plano profissional.
Com
uma extraordinária qualidade das imagens e do som, com a história construída e
desenvolvida de forma original e interessante, com a excelente atuação dos três
atores principais e um argumento intrigante e excelente realização, Florbela é um filme capaz de marcar uma
nova época na cinematografia portuguesa. Este é um filme que não intriga apenas
os conhecedores e estudiosos da vida e obra de Florbela Espanca, narrando com
intensidade e um lirismo profundo a complexa e comovedora relação entre a
poetisa e o seu irmão Apeles. É uma obra artística que põe a tónica no lado
humano da poeta, sem a condenar pelos seus erros, e desmentindo as possíveis
especulações sobre a natureza da relação entre ela e o irmão. Trata-se de uma
obra de arte que fala sobre a proximidade, o amor, o carinho, a ternura, a
procura da felicidade e da realização pessoal, mas também é um filme sobre a
perda e a dor, a criação poética e a crise artística. Não sendo um clássico
filme com declamações dos poemas de Florbela, esta obra abre o caminho não apenas para um melhor
conhecimento de um período na vida da poeta (os quatro dias anteriores à morte
do seu amado irmão Apeles), como representa o convite para o auto-conhecimento
de cada um de nós. A reflexão sobre a felicidade (se ela se encontra ao virar
da esquina ou há que buscá-la), sobre a dor (“tem que doer, se não doesse, não
estaríamos vivos”), a (im)possibilidade de se encontrar o amor da sua vida, a
(não) aceitação da morte, e o processo de libertação são os pontos mais fortes
deste filme, que nos tocam a todos e que não deixam ninguém indiferente. Sem
cair em clichés e na banalidade, o filme sobre a vida da poeta dá uma visão
sofisticada e sublime dos complexos e diversos sentimentos femininos e humanos,
oferecendo elementos de catarse comparáveis aos das heroínas gregas da
Antiguidade clássica.
As
personagens estão construídas de forma a não se reduzirem aos típicos heróis
dos filmes, profundas, vivas e autênticas, com as virtudes e fragilidades que
as tornam ainda mais humanas e verídicas. No desenvolvimento de Florbela e do
seu irmão nota-se uma sincera cumplicidade, uma profunda compreensão mútua,
mesmo em silêncio como acontece no início do filme, a confiança e o apoio, que
devem ser valorizados tanto no caso destas duas personalidades, como no caso de
quaisquer outros irmãos.
Indiretamente
o filme condena o medo de pensar dos Portugueses do tempo ditadura
da
Primeira República, como o medo geral de exprimir os próprios pensamentos e
sentimentos.
Este
filme é belo, emocionante, multifacetado e com certeza absoluta vale a pena ser
visto.
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