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sábado, 13 de octubre de 2012

Mário de Sá- Carneiro traduzido para sérvio

Mário de Sá-Carneiro 7
Eu não sou eu nem sou o outro
sou qualquer coisa de intermédio
pilar da ponte de tédio
que vai de mim para o Outro
Mario de Sa- Karnejro
7
Ja niti sam ja niti Druga Licnost
neodredjeno sam nestp ozmedju ovoga
stub sam koji nosi od came sazdan most
koji vodi od mene do Drugoga
Prevod: Anamarija Marinovic

tradução do poema Comigo me desavim de Sá de Miranda para sérvio

Comigo me desavim,
sou posto em todo perigo;
não posso viver comigo
nem posso fugir de mim.
Com dor, da gente fugia,
antes que esta assi crecesse;
agora já fugiria
de mim, se de mim pudesse.
Que meio espero ou que fim
do vão trabalho que sigo,
pois que trago a mim comigo,
tamanho imigo de mim?
Sá de Miranda

Sam sa sobom razidjoh se
u svakoj se opasnosti nalazim
sam sa sobom ne mogu da zivim
niti mogu da pobegnem od sebe.
Sa bolom od ljudi sam bezao
pre no sto bi ovaj bol tako narastao
Sada bih vec pobegao
od sebe kad od sebe bih mogao.
Kakvu sredinu ocekujem, kakav svrsetak
od zaludnog posla koji sledim
jer samog sebe sa sobom nosim
tolikog sopstvenog neprijatelja.
Prevod: Anamarija Marinovic

viernes, 12 de octubre de 2012

regresso aos clássicos portugueses: Alves Redol

ALVES REDOL (1962) Constantino, Guardador de Vacas e de Sonhos, Publicações Europa-América, Lisboa121 pp.
Na altura do seu aparecimento considerada a mais bela obra da literatura neo-realista infantil, hoje em dia pouco estudada e talvez um tanto esquecida, a história sobre Constantino é muito mais do que uma narrativa de um menino da região saloia ribatejana. Trata-se de uma história cheia de ternura, dedicação, devoção que o autor mostra ter pelas pessoas do povo e pelo processo de crescimento das crianças, a sua forma de descobrir o mundo, de integrar-se na comunidade à qual pertencem, de ligar-se às suas raízes e á natureza, procurando o seu caminho singular até à vida adulta.
 Inspirando-se na infância de um menino que conhecia, Constantino Cara-Linda, o autor escreve para todas as crianças portuguesas da mesma idade e estatuto social do protagonista, mostrando a beleza e a dureza da ida na aldeia, as aspirações, os desejos, as ânsias, as preocupações, os temores de um rapaz que deseja realizar o seu maior sonho: o de deixar de ser um simples guardador de vacas e de se tornar em serralheiro de navios.
Muitas vezes classificado como "romance de aprendizagem " ou de "formação", Constantino  Guardador de Vacas e de Sonhos é o romance por excelência que apoia o desenvolvimento correcto da personalidade de um rapaz que sabe perfeitamente o seu lugar dentro da hierarquia familiar, que respeita os adultos, mas que encontra uma forma pícara e engenhosa de lhes responder "jogando as palavras como pedras de uma atiradeira" (p.18). Este rapaz tem as suas brincadeiras com os meninos da sua idade, sendo o Manel o seu fiel camarada e companheiro das numerosas aventuras e processos de se tornar "um verdadeiro homem".
Pela escolha de um nome singular, que ninguém na família tem, que além disso é um "nome da cidade", O autor pretende salientar que este menino tem a possibilidade de ter um destino diferente e que a sua personagem merece uma atenção particular: chamado desde a infância de " cantigas" e "Cuco", alcunhas familiares do lado dos seus pais, gosta muito da natureza e sobretudo de pássaros, conhece tão bem as suas espécies que até se julga "grão senhor de cinquenta ninhos". As suas aspirações, porém, não se limitam ao mundo rural e fará tudo o que for ao seu alcance para realizar a sua ideia de ter um emprego relacionado com os barcos, tendo ela nascido no seu coração no dia em que o pai o levou a Lisboa pela primeira vez para ver os barcos e o rio Tejo.
Parecendo inicialmente teimoso, um pouco desobediente (quando faz de conta que não ouve a avó a chamar-lhe e pedir-lohe alguma tarefa), preocupado com o seu suposto defeito do nariz grande (sem ter entendido a expressão popular "ser o senhor do seu nariz), revoltando-se contra os mimos que a mãe dá à sua irmã mais nova Ana Maria, Constantino tem ainda muito de criança. Quando aos seus doze anos tem a sua primeira conversa "de homem para homem" com o pai, essa experiência resulta ser muito enriquecedora, uma vez que nela descobre que "um homem nunca chora, mesmo que veja as tripas doutro na mão" (p.29), que não deve invejar a sua irmã pelo carinho que lhe dão "por ser pequenita", que a mãe não o ama menos que a menina, que a avó é uma pessoa muito sábia, que a educação e a escola são importantes e que há que respeitar a sua Professora. É então que ele começa realmente a crescer, acordando muitas vezes à mesma hora que o pai para irem guardar as vacas e fazerem outras tarefas da aldeia, estudando a história e a geografia, embora não se deixando humilhar pela sua Professora e não mostrando medo das reguadas. No seu processo de crescimento, o protagonista descobre que deve ajudar a sua irmã pequena a crescer e por isso usa a sua imaginação para lhe contar histórias bonitas, sendo a do toiro azul capaz de voar  a que mais a marcou.
Nesta obra criticam-se alguns métodos disciplinares demasiado rígidos, fomenta-se a esperteza a e a aprendizagem por todas as vias (mediante a escolarização formal, com os familiares e amigos e pela experiência própria).  Constantino aprende também a responder de forma nem sempre muito gentil aos que pretendem magoá-lo ou ofender algum familiar seu, Desta forma, na sua réplica: "pois não, vossemecê nas caçadas só mata copos, e o meu pai mata coelhos e perdizes", pode vislumbrar-se o início de uma determinada rispidez e talvez de má educação, como também pode notar-se a plena consciência que o menino tem de alguns problemas que os adultos da sua comunidade enfrentam (a dependência do álcool e a mentira como vontade de apresentar a realidade mais bonita do que é).  Entre outros assuntos estreitamente ligados ao processo de crescimento e da aprendizagem que Alves Redol coloca perante o leitor encontra-se a necessidade de salientar a importãncia de uma educação correcta, do estímulo de boas relações familiares e tambémm se se deve falar sobre a morte, os crimes e outros problemas da vida real na presença das crianças.
No episódio sobre a amizade de um dia com um rapaz da cidade, o autor ensina que na vida existem também desilusões, amizades que não resistem a prova do tempo, mas também se põe de lado do mundo rural e da sabedoria do campo por oposição à uma certa corrupção e artificialidade da cidade, o que é um, tema que atravessa todo o neorealismo português.
Com Constantino aprende-se que tuddo o que nos acontece na vida tem a sua utilidade, que "a cadeia fez-se prós homens", que "o homem não se mede pelo tamanho, mas sim pela coragem e pelas obras" e que é preciso "conhecer terras mais distantes", quer no sentido literal, quer no figurado da expressão.
Ligado á sua terra, família e tradições, com os pés bem assentes na terra, mas com a cabeça cheia de sonhos  e o coração de ideais, Constantino é uma criança parecida com muitas outras, mas ao mesmo tempo peculiar, com todos os seus deefeitos (o orgulho, a teimosia, o desejo de não admitir o seu medo) e virtudes (a dedicação a tudo o que faz, o amor pela liberdade e independência, o cuidado para realizar o que deseja).
esta é sem dúvida, uma obra clássica da literatura portuguesa, que as crianças merecem conhecer e ler, para verem e avaliarem o valor do esforço, da renúncia e da aprendizagem, que as levarão a assumir responsabilidades e a tornarem-se adultas no verdadeiro e pleno sentido da palavra.

miércoles, 10 de octubre de 2012

un poema de Juan del Encina traducido al serbio

  ¡No te tardes que me muero
    Carcelero,
no te tardes que me muero!

   Apresura tu venida
porque no pierda la vida
que la fe no está perdida.
    Carcelero,
¡no te tardes que me muero!
Bien sabes que la tardança
trae gran desconfiança;
ven y cumple mi esperança,
carcelero,
no te tardes que me muero!

   Sácame de esta cadena,
que recibo muy gran pena
pues tu tardar me condena.
    Carcelero,
¡no te tardes que me muero!

   La primera vez que me viste,
sin lo sentir me venciste;
suéltame pues me prendiste.
    Carcelero,
¡no te tardes que me muero!

   La llave para soltarme
he de ser galardonarme,
prometiendo no olvidarme.
    Carcelero,
¡no te tardes que me muero!


Fin

Y siempre cuanto vivieres
haré lo que tú quisieres
si merced hacerme quieres.
Carcelero,
no te tardes que me muero.
Не одоцни јер сам на умору Хуан дел Енсина

Не одоцни јер сам на умору
тамичару
Не одоцни, јер сам на умору!

Убрзај долазак свој
да не изгубим живот свој
јер вера јоште постоји,
тамничару,
не одоцни јер сам на умору.

Добро знаш да одоцњење
носи велико неповерење
Дођи и испуни моје надање
тамничару,
не одоцни јер сам на умору!

Избави ме из овог синџира
јер велику казну примам
одоцњење твоје осудом ме дарива
тамничару,  не одоцни јер сам на умору!

Први пут кад видео си ме
Да не осетих победио си ме
пусти ме, јер везао си ме
тамничару,
не одоцни јер сам на умору!

Кључ да ме ослободиш
биће тај да ме наградиш
обећањем да ме не заборавиш,
тамичару,
не одоцни јер сам на умору!

Крај

И све док будем био жив
Радићу све што хоћеш ти
Ако желиш милост да учиниш ми
тамничару,
не одоцни јер сам на умору!
Превод: Анамарија Мариновић

Traducción de un poema de Gill Vicente al serbio

Muy graciosa es la doncella,
¡cómo es bella y hermosa!

Digas tú, el marinero
que en las naves vivías,
si la nave o la vela o la estrella
es tan bella.

Digas tú, el caballero
que las armas vestías,
si el caballo o las armas o la guerra
es tan bella.

Digas tú, el pastorcico
que el ganadico guardas,
si el ganado o los valles o la sierra
es tan bella.


Врло је љупка ова дева
како је красна и лепа!

Реци ти, о морнару,
што на баркама живео си,
је ли барка или једро или звезда
тако лепа.

Реци ти, о витеже
што оружје навлачио си
је ли коњ ил' рат ил' војна опрема
тако лепа.

Реци ти, о пастирчићу
што ситну стоку чуваш
је ли стока или долине ил' планина цела
тако лепа.
Превод: Анамарија Мариновић

martes, 9 de octubre de 2012

владика Николај у преводу на португалски, o Bispo Nikolaj na tradução para português

Све ће добро бити  Свети Владика Николај
Бог отаца наших Бог је и синова,
Чувар земље наше и наших домова.
Кроз чудеса страшна, кроз паклене страве,
Он је оце наше довео до славе.
Стопу све по стопу, кроз огањ и воду,
Дариво им милост, снагу и слободу.
Зато нико од њих не хте веру крити:
"Наш је Творац с нама – све ће добро бити!"

Бог ђедова наших Бог је и унука:
Исцелитељ рана, Победитељ мука.
Увек исти Господ, Господ над војскама;
Ка'но ђедовима – помаже и нама.
Ка'но светом Сави тако и Душану,
Ка'но Милутину тако Страхињ бану.
Претци и потомци, и гладни и сити,
Један језик знаше: "Све ће добро бити!"

Ускликнимо и ми: Све ће добро бити!
Та навек ће зора поноћ наследити.
Све ће добро бити! нека младић рекне,
Све ће добро бити! нека старац јекне,
Све ће добро бити! певали су свеци,
Све ће добро бити! певај, мајко, деци.
Све ће добро бити! свештеници, појте.
Све ће добро бити! народи, утројте.
Шта је језик српски? Шта српски зборити?
То су чет'ри речи: Све ће добро бити.
Tudo vai bem ficar                    Santo Bispo Nikolaj Velimirović

O Deus dos nossos pais Deus é dos filhos
Guardião da nossa terra e dos nossos lares
Pelos milagres terríveis pelos horrores infernais
Ele guiou até à gloria os nossos antepassados e pais
Pegada à pegada, pelo fogo e pela água
Concedeu-lhes a graça, a força e a liberdade
Por isso ninguém deles quis a fé ocultar
“ O nosso Criador connosco- tudo vai bem ficar!”

O Deus dos nossos avós Deus é dos netos
Curador das feridas, Vencedor dos sofrimentos
Sempre o mesmo Senhor, Senhor dos exércitos
Ajudou os avós ajudar-nos-á a nós
Como a São Sava, como a Dušan
Como a Milutin, como a Strahinj ban
Antepassados e descendentes
Saciados ou fome a passar
Uma língua sabiam: “ Tudo vai bem ficar!”

Exclamemos nós também : “ Tudo vai bem ficar!”
A aurora vai sempre a meia-noite habitar.
Tudo vai bem ficar, que diga o rapagão
Tudo vai bem ficar, que soluce o ancião
Tudo vai bem ficar cantaram os santos
Tudo vai bem ficar, canta, mãe, às crianças
Tudo vai bem ficar, sacerdotes cantai
Tudo vai bem ficar, povos, triplicai
O que é a língua sérvia, o que é sérvio falar,
São quatro palavras: “Tudo vai bem ficar!”

Tradução: Anamarija Marinović

tradução de um poema religioso do Santo Bispo Nikolaj Velimirovic do sérvio para português

Знаш ли ко те љуби силно? Владика Николај Велимировић (1881-1956) из
„ Духовне Лире“

Знаш ли ко те љуби силно
Ко те чува дан и ноћ,
Ко ти даје изобилно
Да одолиш врагу моћ?
Знаш ли ко ти живот дао,
Оца, мајку, брата твог,
И ко те је обасјао
Светлим зраком Духа свог?
Знаш ли ко је умро за нас,
На Голготи, знаш ли то,
И радости обећате,
Ко ти спрема знаш ли то?
Мораш знати ко то чини,
Ко то тако љуби нас,
То је Господ са висине,
То је Христос свима Спас
Sabes quem é que com fervor te ama? Bispo Nikolaj Velimirović (1881-1956) da “Lira Espiritual”
Sabes quem é que com fervor te ama
Quem é que te guarda dia e noite
Quem é que em abundância te dá
O poder para ao Diabo opores-te
Sabes quem é que a vida te doou
O pai, a mãe, um irmão teu
E quem é que te iluminou
Com o raio luminoso do Espírito seu.
Sabes quem é que por nós morreu
No Calvário, sabes disso?
E as alegrias que prometeu
Quem tas prepara, sabes disso?
Deves saber quem assim faz
Quem dessa forma nos ama a nós
E o Senhor das alturas
É Cristo salvador de todos.

lunes, 8 de octubre de 2012

terapia cinematográfica para casais de meia idade

Filme: Terapia a dois (Hope Springs)
com: Meryl Streep, Tommy Lee Jones, Steve Carell, Jean Smart
Realização: David Frankel
Género: Drama/Comédia
Após trinta e um anos de casamento Kay e Arnold, um casal economicamente bem situado, com dois filhos adultos e com as suas vidas independentes, está a viver na rotina da quotidianidade até que ela decide inscrever os dois numa terapia intensiva para casais, organizada numa ilha por um célebre autor de livros de auto-ajuda.
Desconfiando deste tipo de programas que oferecem soluções fáceis e propostas milagrosas, Arnold começa a expressar não apenas as suas queixas contra o doutor e as suas ideias, como também a admitir que tem alguns problemas com a esposa, sem os ter discutido sequer com ela.
Os dois tentam seguir as instruções do seu terapeuta (o exercício de dormirem abraçados, de tocarem-se de uma forma mais sensual, de introduzirem algumas novidades na sua vida íntima. Estes conselhos ás vezes falham e eles sentem-se obrigados (quer por causa do dinheiro investido, quer pelas suas próprias expectativas), e ao voltarem para casa encontram a sua própria forma de encarar e resolver os seus problemas, renovando os votos de casamento rodeados pelos filhos e amigos mais próximos.
A construção de duas personagens profundas e complexas como Kay e Arnold ajuda o espectador a entender melhor a dificuldade que as pessoas por vezes têm de admitir as próprias culpas e a assumir as próprias responsabilidades. No comportamento dos protagonistas nota-se claramente a situação incómoda de falar nos pormenores da sua vida íntima perante um estranho completo, que é o terapeuta, e a dificuldade de recuperar a confiança esqeucida entre os dois.
Falando da fragilidade e da vulnerabilidade tanto do homem como da mulher, toca-se o tema da possibilidade de todos poderem falhar ou acertar nos seus relacionamentos, independentemente da sua experiência ou dos anos que levam juntos.
O episódio do jantar romântico, em que os dois se recordam do seu primeiro jantar importante de namorados, num restaurante modesto de paredes cor-de-laranja revela muito da capacidade de Kay e Arnold de ultrapassarem os seus problemas sem seguirem cegamente os conselhos do seu médico. As memórias das declarações amorosas que faziam ao telefone depois de a conversa real entre eles acabar, as risadas que dão ao imitarem o doutor que os cura, a ideia que os dois têm sobre a sua melhor relação sexual de sempre, são apenas pormenores que ajudam muito mais a que eles construam de novo os momentos mágicos do seu passado, que os estereótipos de filmes tais como os morangos com chocolate comidos junto à lareira ou as dicas sexuais lidas num livro de auto-ajuda.
Embora não tenham introduzido grandes novidades na sua vida íntima, Kay e Arnold desfrutam dela porque conseguiram encontrar a sua felicidade à sua maneira.
A tão repetida e escarnecida metáfora do nariz partido, que significa uma mudança difícil, mas radical, no filme é apresentada também com uma pitada de humor e outra de ironia, referindo-se a todo tipo de terapias e soluções aparentemente acessíveis e compreensíveis a todos. O facto de no fim do filme, o tal nariz de plástico é pisado pelos protagonistas significa ao mesmo tempo a ruptura com a rotina e o passado e uma forma de se ridicularizarem os conselhos fáceis dos best-sellers sobre as relações inter-pessoais.
Um pormenor que gostaríamos de destacar é que o casal introduz as mudanças no seu casamento após trinta e um anos de vida a dois, que não é nem uma data simbólica nem "redonda" nem considerada especial segundo os critérios externos ou superficiais, mas que foi uma data decisiva para Kay e Arnold. Desta forma dá-se um toque mais pessoal à sua situação e foge-se ao estereótipo de que só as datas redondas devem ser significativas para as pessoas.
A excelente actuação dos protagonistas, a atenção que se presta aos pormenores (o pequeno-almoço de Arnold é sempre o mesmo, os programas sobre golfe são sempre aborrecidos e ele adormece, o jornal que ele lê é sempre o mesmo), o bom sentido de humor e as bonitas imagens tanto da natureza como dos espaços interiores fazem com que este filme seja uma diversão simpática, embora não tão ligeira como aparentemente pode ser, ensinando a importância da recuperação da confiança. do sentido de ouvir o outro e de partilhar os belos momentos apesar da realidade quotidiana que pode ser dura e monótona por vezes.

jueves, 4 de octubre de 2012

O mundo kafkiano

KAFKA, Franz (2007), Meditações, Alma Azul, Coimbra, 43 pp.
Desde as reflexões sobre o mundo, a posição do indivíduo dentro dele, a procura do sentido da vida, até as ideias sobre o amor, a crença, a liberdade e o sofrimento, esta compilação das Meditações kafkianas apresenta-nos algumas das vertentes centrais do universo deste escritor, acrescentando sempre um toque de pessimismo e absurdo às suas ideias. Mesmo sendo judeu das origens e sem fé na prática da  sua vida, Franz Kafka revela-nos a sua visão bastante particular dos temas cristãos, nomeadamente a percepção da impaciência e da preguiça como dois pecados capitais. Mesmo que à primeira vista isto contrarie os dogmas cristãos, na perspectiva do escritor, a primeira característica é a causa da expulsão do homem do paraíso e a segunda da sua impossibilidade de regressar lá.
Nesta linha de pensamento, desenvolvem-se também as ideias sobre amar a si mesmo e amar o próximo "mesmo no íntimo", o que por sua vez pode coincidir com o pensamento cristão sobre este tema.
No livro a ser analisado manifesta-se também a necessidade da luta do indivíduo contra e com o mundo, do sofrimento, da conquista da liberdade, da ociosidade como "o único dos vícios e coroamento de todas as virtudes". Debruçando-se um pouco mais sobre este assunto, ver-se-á que aparentemente estas duas afirmações são paradoxais. Tendo em conta o ponto de partida sobre a preguiça (e talvez um determinado grau de indiferença) do homem como a principal razão da sua infelicidade e incapacidade de atingir o absoluto, a ociosidade é ao mesmo tempo um descanso merecido depois do sofrimento e da dor que fazem parte do dia-a-dia dos hoemns.
Nesta colectânea reflexiona-se sobre o Bem, que por vezes pode ser desolador, sobre a mortalidade e imortalidade do indivíduo, a sua impossibilidade de se sentir realizado completamente, refere-se também um estreita relação entre o celibato e o suicídio, sendo as duas formas apropriadas de se salientar a falta e a ausência da plenitude, que são motivos muito recorrentes na escrita de Kafka.
Extraídos do contexto original, estes fragmentos parecidos com aforismos abundam de sabedoria e pintam muito bem o universo literário, estético e filosófico deste autor, convidando o  leitor a conhecerem melhor a sua obra e os seus temas e modos de pensar, sentir e escrever.

sábado, 29 de septiembre de 2012

mudanças e vida quotidiana

VIEIRA, Alice (2009), Lote 12 2º Frente, Editorial Caminho, Lisboa
Descrever coisas da vida quotidiana, tais como a mudanã de casa e da escola,  falar sobre a decisão de se comprar um apartamento em vez de se continuar a pagar a renda ao senhorio, lidar com a morte de seres queridos, abordar o assunto do insucesso escolar e dos problemas familiares, da emigraç\ao portuguesa, da solidão das pessoas mais velhas nas grandes cidades e nas relações interpessoais, explicar alguns pormenores importantes na História de Portugal e ao mesmo tempo alertar as meninas para algumas mudanças no seu corpo, é possível num só livro, tal como o mostra Alice Vieira neste breve romance.
Narrada pela Mariana, uma adolescente de doze anos, a história de uma típica família portuguesa que muda de casa traz ao leitor uma visão interessante do mundo que rodeia a protagonista, Mundo esse, sentido pelos diversos cheiros específicos que fazem parte da vida quotidiana, integra em si a avó Elisa, a tia Magda, os pais da Mariana, a sua irmã pequena Rosa, a memória da falecida avó Lídia, algumas amigas e vários adultos. Neste livro é explicado às crianças, que as mudanças na vida são necessárias, e que por mais estranhas que nos pareçam no início, têm as suas desvantagens e as suas mais-valias. Assim aconteceu também com a nova casa da família Fonseca, situada na Rua projectada à Praceta B, num Lote 12 2º frente em Lisboa. Uma rua impessoal, num bairro não identificado, uma casa que cheira a novo e a limpo convidam os seus moradores a fazerem um esforço a "darem gente à casa", isto é a atribuírem-lhe uma identidade única, uma marca personalizada e reconhecível,por causa da qual será mais agradável viver-se ali.
No caso da Mariana isso torna-se fácil, porque na nova zona ela cria amizades com a Susana, a Cláudia e a Isabel, embora não se tenha esquecido da Rita, sua amiga de infância, a quem escreve cartas e passa uma passagem de ano.
Este livro toca em alguns problemas que afectam a sociedade portuguesa actual: o crédito de habitaçaõ e até que ponto esta é uma decisão prudente nos tempos que correm, o insucesso escolar de um menino de família problemática (que tem uma mãe com problemas nervosos e um pai que bebe muito e bate nele), pode levantar polémica sobre a necessidade e forma de se falar na primeira menstruação das meninas, mas também ensina um pouco sobre a solidariedade (nas reflexões que a protagonista partilha com as suas colegas da turma sobre como é que seria o Natal do Jorge, o aluno problemático, no comportamento do pai da Mariana com o seu vizinho Sr. Guerreiros etc.). O romance ensina também que não é bonito ser-se bisbilhoteira, que não se deve ser bom apenas no Natal e no Ano Novo, que os irmãos mais velhos devem tomar conta dos mais novos, ter paciência com eles e educá-los, tal como a Mariana faz com a Rosa.
Entre alguns pontos tal vez menos desenvolvidos deve salientar-se a ideia da preocupação da protagonista com os problemas do Jorge, podendo ela ter feito alguma coisa concreta para fazer o seu Natal mais feliz (enviar-lhe um cartão de parabéns, indo a visitá-lo por exemplo), mas o romance não aprofunda este pormenor.
Um outro ponto menos  elaborado é a descrição detalhada da composição da Mariana sobre Viriato que depois não provoca nenhuma reacção na escola e parece estar no livro apenas para os leitores conhecerem esta parte da História portuguesa.
Reproduzindo fielmente a linguagem quotidiana